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Maior base da Antártida alimenta pessoas com comida quase toda congelada e sem chance de ficar sem suprimentos

Um único navio anual para manter estoques, organizar refeições industriais e sustentar pessoas isoladas em um ambiente de luz extrema e frio permanente

Na maior base científica da Antártida, manter mais de mil pessoas alimentadas depende de um único comboio marítimo por ano, de estoques planejados para resistir a 12 meses de isolamento e de um refeitório que segue funcionando mesmo quando o sol não se põe.

Em McMurdo Station, operação que reúne a maior comunidade permanente do continente, a comida chega quase toda congelada ou desidratada e passa a ser tratada como infraestrutura tão estratégica quanto combustível, pista de pouso ou sistemas de comunicação.

Base McMurdo e sua função logística na Antártida

Localizada na ponta sul da ilha de Ross, McMurdo é administrada pela National Science Foundation como o principal polo logístico do programa antártico dos Estados Unidos.

Documentos oficiais descrevem a estação como a maior base do continente, com capacidade para algo em torno de 1,2 mil a 1,4 mil pessoas no auge do verão austral, entre outubro e fevereiro, quando pesquisadores, técnicos e equipes de apoio se concentram na região.

Nessa época, o local também funciona como ponto de passagem para o Polo Sul e para outros campos de pesquisa, o que amplia o impacto de qualquer falha no abastecimento.

Operação de reabastecimento anual

Todo o sistema gira em torno de um reabastecimento anual por mar. Uma vez por temporada, geralmente entre dezembro e fevereiro, um quebra-gelo da Guarda Costeira dos EUA abre um canal até a enseada que serve de porto à base.

Na sequência, chega um navio porta-contêineres fretado pelo Military Sealift Command, em uma operação integrada conhecida como Operation Deep Freeze, responsável por levar à Antártida a maior parte do que será consumido ao longo do ano seguinte.

Em diferentes temporadas, cargueiros como o MV Ocean Giant deixaram portos norte-americanos carregando milhares de toneladas de suprimentos.

Comunicações oficiais da Marinha e da NSF descrevem essa carga como “um ano de equipamentos e suprimentos” para McMurdo, incluindo comida, peças, veículos, materiais de construção e equipamentos científicos.

Em uma das operações recentes, o Ocean Giant descarregou cerca de 6 mil toneladas de suprimentos, com destaque para alimentos congelados e secos que serão consumidos ao longo de até 12 meses.

Relatos militares indicam que esse volume responde por perto de 80% do que a estação precisa para manter ocupação o ano inteiro, enquanto outro navio-tanque, em campanha separada, leva combustíveis para aquecimento, geração de energia e aeronaves.

Se o comboio não consegue completar a viagem por problemas de gelo, de casco ou de manutenção, documentos indicam que a base pode ser obrigada a reduzir o número de pessoas no local, com impacto direto sobre o número de projetos científicos em operação.

Como os estoques são organizados

Assim que os contêineres deixam o navio, a comida muda de status: deixa de ser carga em trânsito e passa a integrar o estoque estratégico da estação.

Relatos de integrantes de expedições à Antártida, somados a apresentações públicas sobre a infraestrutura de McMurdo, citam um grande edifício usado quase exclusivamente para armazenar um ano de comida, com câmaras e depósitos refrigerados dominados por produtos congelados.

Esse padrão é descrito também em materiais educacionais sobre a região, que indicam que bases de grande porte costumam receber, em um único lote, todo o volume de alimentos planejado para o período entre dois verões sucessivos.

O que chega na estação e como é consumido

A lógica desses estoques segue uma regra simples: quanto mais resistente ao tempo, melhor. Enciclopédias e guias sobre McMurdo relatam a chegada anual de grandes quantidades de enlatados, grãos, massas, farinhas, leite em pó e outros alimentos secos de longa duração, que formam a base do cardápio.

Produtos perecíveis, como frutas, verduras e alguns tipos de carne fresca, entram em quantidades menores, transportados principalmente por aviões de carga ou incluídos em contêineres específicos que não podem congelar.

Uma pequena estufa instalada na estação fornece hortaliças em escala limitada e é descrita por pesquisadores como um benefício mais psicológico do que nutricional. Relatos de cientistas e funcionários reforçam que “quase nunca há alimentos frescos” disponíveis.

No dia a dia, a regra é consumir carnes, massas, vegetais e frutas na forma de produtos congelados ou desidratados, preparados em grandes quantidades pela equipe de cozinha.

Quando chega um lote de “freshies”, a distribuição vira um pequeno evento, justamente pela raridade.

Esse esquema também aparece em programas antárticos de outros países, com cardápios apoiados majoritariamente em produtos congelados ou enlatados e reforço pontual de hortaliças frescas quando o clima permite o acesso por mar ou ar.

A galley e a rotina de alimentação

No cotidiano da estação, todo esse planejamento deságua no refeitório central, a galley, instalada no prédio 155. A mesma construção abriga dormitórios, lojas, barbearia e parte dos serviços básicos, e aparece em documentos oficiais como o principal ponto de encontro da comunidade.

Quase todos passam por ali ao menos uma vez ao dia. O serviço é em bandejão, com filas em estilo cafeteria, variedade de pratos quentes e opções fixas como sopas, cereais e café.

Não há cobrança por refeição, mas comunicados internos pedem que as pessoas se sirvam apenas do que de fato vão consumir, como forma de evitar desperdícios.

Relatos de ex-funcionários comparam o ambiente a um grande refeitório universitário, com várias linhas de atendimento e pizza disponível praticamente o tempo todo. Na cozinha, a operação é tratada como produção industrial.

Uma cozinheira descreve uma equipe responsável por quatro serviços diários: café da manhã, almoço, jantar e o “midnight lunch”.

Nos bastidores, o trabalho se estende à chamada “pot room”, sala de lavagem de panelas sem janelas, com utensílios superdimensionados para atender centenas de pessoas.

Consultorias em projetos de cozinhas industriais estimam que a estação precisa planejar cerca de 1 milhão de refeições por ano, somando as diferentes estações.

O volume exige cardápios cíclicos de 30 a 35 dias, repetidos para manter previsibilidade e compatibilidade com o estoque disponível.

Anúncios de vagas para subchefes citam tarefas como coordenar o uso de vegetais frescos, ajustar sabores, reaproveitar sobras de forma segura e monitorar temperaturas de preparo e conservação.

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