Curiosidades

O desafio dos 21 metros: por que o Canal de Corinto, um atalho de 700 km, se tornou a passagem mais temida do mundo

O impressionante atalho geológico, construído em 1893, é um triunfo da engenharia, mas sua largura mínima de 21,3 metros e sua geologia instável o tornaram obsoleto para o comércio global, transformando-o em um desafio de precisão e atração turística

Canal de Corinto, que liga o Golfo de Corinto (Mar Jônico) ao Golfo Sarônico (Mar Egeu), é uma das vias navegáveis mais singulares do mundo, representando uma incisão linear de 6.346 metros através do estreito Istmo da Grécia. Embora concebido para poupar aos marinheiros uma perigosa circum-navegação de 700 quilômetros (430 milhas náuticas) do Peloponeso, o que é confirmado por dados da NASA Earth Observatory, as suas dimensões austeras de apenas 21,3 metros de largura no fundo tornam a navegação uma proeza de “precisão cirúrgica” para a maioria das embarcações.

Operado pela Corinth Canal S.A. (A.E.DI.K), o canal cortou a península, transformando-a efetivamente numa ilha. Contudo, seu perfil de engenharia, com paredes de até 90 metros de altura e um corte quase vertical, gerou um passivo geológico permanente que exige manutenção perpétua. As extensas obras de restauração realizadas entre 2021 e 2025, de acordo com comunicados da A.E.DI.K, sublinham a luta contínua contra a instabilidade que tem assolado este monólito de ambição humana.

A luta milenar contra a geologia: de Nero ao Diolkos

O sonho de perfurar o Istmo de Corinto é quase tão antigo quanto a própria Grécia. No século VII a.C., Periandro, o Tirano de Corinto, contemplou a obra, mas abandonou o projeto, temendo erroneamente que a diferença nos níveis do mar pudesse causar uma inundação catastrófica, e possivelmente influenciado por um oráculo. Em vez disso, ele criou o engenhoso Diolkos, uma estrada pavimentada que funcionava como uma proto-ferrovia onde os navios (e suas cargas) eram arrastados sobre vagões através do Istmo.

A tentativa mais substancial na antiguidade foi feita pelo imperador romano Nero em 67 d.C., que iniciou pessoalmente as obras com uma picareta de ouro. Uma força de trabalho de 6.000 prisioneiros judeus escavou cerca de 3.300 metros de comprimento. Contudo, a morte súbita de Nero levou ao abandono imediato do projeto, deixando a obra inacabada por 1.800 anos.

O triunfo e o erro da engenharia do século XIX

O verdadeiro catalisador para a construção moderna foi a abertura do Canal de Suez em 1869, demonstrando a viabilidade e o poder econômico das vias navegáveis artificiais. Em 1881, o projeto foi adjudicado ao General István Türr, que fundou a Sociedade Internacional do Canal Marítimo de Corinto. A construção começou em 1882, dependendo fortemente da dinamite recém-inventada para explodir através da rocha sedimentar.

Apesar da tecnologia, a geologia provou ser mais dispendiosa do que o previsto, e a empresa internacional faliu. O projeto foi resgatado por uma empresa grega e finalmente inaugurado em 25 de julho de 1893. No entanto, a necessidade de minimizar os custos de escavação resultou em dimensões estreitas, 24,6 metros na superfície e 21,3 metros no fundo, que se revelariam uma falha fatal. Quase no momento da abertura, a arquitetura naval já estava a evoluir para navios de aço maiores, o que significava que o Canal de Corinto nasceu quase obsoleto para as grandes rotas comerciais.

O recorde do MS Braemar e a mudança de foco

Os limites físicos e a precisão necessária foram dramaticamente ilustrados em outubro de 2019, quando o navio de cruzeiro MS Braemar da Fred. Olsen se tornou a maior embarcação a transitar pela via navegável. De acordo com Relatórios Marítimos, o navio tinha 22,5 metros de boca (largura), o que significava que, dada a largura da superfície de 24,6 metros, o navio tinha uma folga total de apenas 2,1 metros ou seja, cerca de 1 metro de cada lado.

Este trânsito, descrito por seu capitão como exigindo concentração intensa, destacou a mudança fundamental no valor do canal. Embora a poupança máxima de até 700 km seja significativa, a economia de escala para um cargueiro moderno é mais importante do que a economia de distância. O canal é economicamente irrelevante para o comércio global pesado, mas tornou-se vital para a economia da experiência, com o trânsito em si a ser o produto principal, impulsionando iates de luxo e pequenos e médios navios de cruzeiro.

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