Um em cada três brasileiros sofre com insegurança alimentar
ONU afirma que 70,3 milhões de pessoas, em algum grau, passam fome no país; em 2016, eram 37,6 milhões de famintos
O Brasil tem 70,3 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar moderada ou severa. O número consta em um relatório da ONU (Organização das Nações Unidas), intitulado “O estado de segurança alimentar e nutrição no mundo em 2023”, que considera os números registrados entre 2020 e 2022, divulgado nesta quarta-feira (12).
Na prática, significa dizer que um em cada três habitantes do país passa algum tipo de necessidade alimentar todos os dias – o último censo demográfico do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostrou que o país tem 203 milhões de pessoas.
A quantidade de famintos aumentou em 32,7 milhões em relação à do período de 2014 a 2016, quando, segundo a ONU, 37,6 milhões de pessoas sofriam, em algum grau, com o problema.
Além da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), assina o estudo o Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância).
- Fome no mundo
O número de pessoas que passam fome no mundo se estabilizou em 2022, após sete anos de alta, um “avanço modesto” e insuficiente para cumprir a meta de eliminar esse flagelo até 2030. Cerca de 735 milhões de pessoas passaram fome neste ano, o equivalente a 9,2% da população mundial, alerta o relatório.
O número, que vinha aumentando desde 2015, estabilizou-se e até registrou uma leve queda, com menos 3,8 milhões de pessoas em relação ao de 2021. A América Latina registrou avanços no combate à fome, com exceção da região do Caribe, onde a situação se agravou.
A desnutrição crônica também aumentou na Ásia Ocidental e na África, diz o relatório, que também leva o selo do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida), do Programa Mundial de Alimentos (PMA) e da Organização Mundial da Saúde (OMS).
O relatório anual sobre o estado da segurança alimentar e nutricional no mundo revela que, na África, uma em cada cinco pessoas sofre de desnutrição crônica.
O documento é um “retrato de um mundo ainda se recuperando de uma pandemia e que agora se debate com as consequências da guerra na Ucrânia, que agitou ainda mais os mercados de alimentos e de energia”. Desde 2019, essas duas crises acrescentaram 122 milhões de pessoas ao mapa da fome.
Embora a recuperação econômica pós-pandemia tenha melhorado a situação, “não cabe dúvida de que esse modesto progresso se viu minado pela alta dos preços dos alimentos e da energia, amplificada pela guerra na Ucrânia”.
O relatório adverte: sem esforços mais bem direcionados, a meta de “acabar com a fome, a insegurança alimentar e a desnutrição em todas as suas formas até 2030 permanecerá fora do nosso alcance”.
- Novo normal
Na América Latina e no Caribe, a prevalência da desnutrição – o indicador que mede a fome – caiu de 7%, em 2021, para 6,5%, em 2022, o que representou uma redução de 2,4 milhões no número de pessoas que passam fome. Essa redução se explica pela evolução na América do Sul (de 7% para 6,1%), já que o Caribe registrou um aumento significativo de 14,7%, em 2021, para 16,3%, em 2022.
“Há raios de esperança. […] No entanto, em geral, precisamos de um intenso esforço mundial imediato para resgatar os objetivos do desenvolvimento sustentável”, defendeu o secretário-geral da ONU, António Guterres, citado no comunicado do relatório.
Se esse avanço não se acelerar, cerca de 600 milhões de pessoas ainda estarão passando fome em 2030, principalmente na África.
Os principais fatores para a insegurança alimentar – conflitos, contração econômica e catástrofes climáticas – e as desigualdades recentes se tornaram um “novo normal”, disseram.
O presidente do Fida, Álvaro Lario, destacou a falta de investimento e de “vontade política para implementar soluções em larga escala”.
A diretora-executiva do PMA, Cindy McCain, ressaltou, por sua vez, que a fome aumenta “ao mesmo tempo que os recursos de que precisamos urgentemente para proteger os mais vulneráveis estão se reduzindo perigosamente”. Para ela, “enfrentamos o maior desafio já visto”.
Como no ano anterior, 2,4 bilhões de pessoas sofriam de insegurança alimentar aguda ou moderada em 2022. Ou seja: três em cada dez pessoas não tinham acesso a uma alimentação adequada.
A possibilidade de as populações terem acesso a uma alimentação saudável se deteriorou em todo o mundo, devido ao impacto prolongado da pandemia nas economias e à disparada no preço dos alimentos, frisou a ONU.
Mais de 3,1 bilhões de pessoas não poderiam pagar por uma dieta balanceada em 2022, o que pode provocar desnutrição, carências nutricionais ou obesidade.