Tarifaço: governo quer barrar mudanças no Congresso que beneficiem setores não atingidos
Para Lula, pacote ‘é só o começo’, mas equipe econômica espera não ter de ampliar investimentos; parte dos recursos ficarão fora da meta

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva teme que o plano de contingência em reação ao tarifaço imposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, seja ampliado durante a tramitação no Congresso Nacional. A medida provisória voltada às empresas prejudicadas pela taxa do governo americano foi assinada por Lula na última quarta (13).
Na avaliação do Executivo, o pacote foi construído “sob medida” e não há espaço fiscal para ampliação dos setores beneficiados.
Um dos temores do governo é o custo fiscal da medida – R$ 9,5 bilhões ficarão de fora da meta para este ano. O valor corresponde a R$ 4,5 bilhões em aportes para fundos garantidores e R$ 5 bilhões em recursos para o Reintegra (Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários para as Empresas Exportadoras).
Entra na conta da gestão petista a força que alguns setores podem ter entre os parlamentares. Para evitar inchaço, Lula apresentou o plano aos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), antes do anúncio formal.
Ainda não há definição de quem será o relator da medida no Congresso nem do presidente da comissão mista que vai analisar o tema. Por ser uma MP, a proposta tem força de lei e passa a valer a partir da assinatura. No entanto, para não perder a validade, é preciso ser aprovada pelo Legislativo em até 120 dias.
Um dia antes do lançamento da MP, a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, afirmou que o texto deve ter impacto reduzido nas contas públicas.
“Nós estamos absolutamente conscientes de que o impacto dele vai ser mínimo e será única e exclusivamente no limite do necessário para não deixar nenhuma empresa para trás”, destacou.
Definições
O pacote prevê, ainda, linha de crédito de R$ 30 bilhões para as empresas afetadas, devolução de parte dos impostos de exportação pagos – por meio do Reintegra – e compras públicas.
A previsão inicial é oferecer acesso facilitado à linha de crédito. Lula afirmou que a medida “é só o começo”, mas a equipe econômica espera não ter de ampliar os benefícios. “Você não pode colocar mais se você não sabe quanto é”, ponderou Lula em entrevista, um dia antes do lançamento da MP.
“Vai ser uma política de crédito, que a gente está pensando em ajudar sobretudo as pequenas empresas – o pessoal que exporta tilápia, frutas, mel e outras coisas, as empresas de máquinas. As grandes têm mais poder de resistência”, acrescentou.
A taxa de 50% foi anunciada por Trump em 9 de julho e começou a valer em 6 de agosto. A princípio, a tarifa seria aplicada a todos os itens do Brasil comprados pelos EUA. No entanto, ao oficializar a medida, o republicano deixou 694 produtos de fora do tarifaço.
Principais medidas do plano de socorro
Linhas de crédito
- R$ 30 bilhões do FGE (Fundo Garantidor de Exportações) serão usados como financiamento para concessão de crédito permitindo taxas acessíveis.
- Prioridades por: dependência do faturamento em relação às exportações para os EUA; tipo de produto e porte de empresa. Serão priorizados os mais afetados.
- As pequenas e médias empresas também poderão recorrer a fundos garantidores para acessar o crédito.
- O acesso às linhas estará condicionado à manutenção do número de empregos.
Prorrogação de prazos do regime de drawback
- Extensão excepcional do prazo para comprovação da exportação de produtos fabricados a partir de insumos importados ou adquiridos no Brasil com suspensão tributária, o chamado drawback.
- O governo vai prorrogar, por um ano, o prazo para que as empresas consigam exportar suas mercadorias que tiveram insumos beneficiados pelo regime. Esses produtos poderão ser exportados para os EUA ou para outros destinos. Com isso, elas não terão que pagar multa e juros se não conseguirem exportar aos EUA no prazo originalmente previsto.
- A medida vale para as empresas que contrataram exportações para os Estados Unidos que seriam realizadas até o final deste ano. Dos US$ 40 bilhões exportados em 2024 para os Estados Unidos, US$ 10,5 bilhões foram realizados via regime de drawback.
- A prorrogação não tem impacto fiscal, pois apenas posterga o prazo para cumprimento dos compromissos de exportação assumidos pelas empresas brasileiras.
Compras públicas: apoio a produtores rurais e agroindústrias
- De forma extraordinária, por ato infralegal, União, estados e municípios poderão fazer compras para seus programas de alimentação (para merenda escolar, hospitais, etc.) por meio de procedimento simplificado e média de preço de mercado, garantidos a transparência e o controle dos processos.
- A medida vale apenas para produtos afetados pelas sobretaxas unilaterais.
Modernização do sistema de exportação
- Ampliação das regras da garantia à exportação, instrumento que protege o exportador contra riscos como inadimplência ou cancelamento de contratos.
- As mudanças visam fortalecer empresas exportadoras de média e alta intensidade tecnológica e investimentos produtivos em economia verde.
- O Plano Brasil Soberano permitirá que bancos e seguradoras utilizem essa garantia em mais tipos de operações.
- Prevê mecanismos de compartilhamento de risco entre governo e setor privado, utilizando o FGCE (Fundo Garantidor do Comércio Exterior) como mecanismo de primeiras perdas, aumentando o acesso a crédito e reduzindo custos.
Fundos garantidores
- Aportes adicionais de R$ 1,5 bilhão no FGCE, de R$ 2 bilhões no FGI (Fundo Garantidor para Investimentos), do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), e R$ 1 bilhão no FGO (Fundo de Garantia de Operações), do Banco do Brasil, voltados prioritariamente ao acesso de pequenos e médios exportadores.
Novo Reintegra para empresas afetadas
- O Reintegra para as Empresas Exportadoras devolve aos exportadores brasileiros parte dos tributos pagos ao longo da cadeia produtiva, na forma de crédito tributário, ajudando a reduzir custos e aumentar a competitividade no mercado externo.
- A medida antecipa os efeitos da Reforma Tributária, desonerando a atividade exportadora.
- Atualmente, empresas de grande e médio porte de produtos industrializados têm alíquota fixada em 0,1%; enquanto micro e pequenas, por meio do programa Acredita Exportação, recebem de volta 3% de alíquota.
- A medida aumenta em até 3 pontos percentuais o benefício para empresas cujas exportações de produtos industrializados foram prejudicadas por medidas tarifárias unilaterais. Ou seja, para continuarem competitivas no mercado norte-americano, grandes e médias empresas passam a contar com até 3,1% de alíquota, e as micro e pequenas, com até 6%.
- As novas condições do Reintegra valerão até dezembro de 2026 e terão impacto de até R$ 5 bilhões.