Política Nacional

Prisão de Bolsonaro interrompe calmaria no Supremo com nova divergência

Ministros têm demonstrado unidade nos últimos anos, mas já protagonizaram diversas dissonâncias; relembre casos emblemáticos

O STF (Supremo Tribunal Federal) deu seus primeiros sinais de divisão desde o início da investigação sobre a suposta tentativa de golpe de Estado após as eleições de 2022 depois que o ministro Alexandre de Moraes decretou a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro (PL), em 4 de julho.

Para o magistrado, relator dos processos contra os acusados de golpismo, o ex-presidente descumpriu a medida cautelar que o proibia de se manifestar nas redes sociais quando teve ligações com o filho Flávio Bolsonaro (PL-RJ), a esposa Michelle Bolsonaro (PL) e o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) em protestos contra o STF exibidas e republicadas nas plataformas digitais.

As cautelares, avalizadas pela Primeira Turma da corte, receberam o voto contrário do ministro Luiz Fux. As discordâncias não param por aí e colegas próximos de Moraes, como Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, têm o aconselhado a maneirar nas decisões diante da elevação da tensão entre Poderes – na Câmara, bolsonaristas chegaram obstruir os trabalhos da Casa em protesto contra a prisão – e das retaliações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

A divisão é uma mudança em relação à postura recente do colegiado, que demonstrou unidade em reação aos ataques ao sistema eleitoral e à invasão do 8 de janeiro. Nos anos anteriores, no entanto, era mais comum encontrar pontos de ruptura entre os ministros do Supremo.

Ramagem fora da PF

Em abril de 2020, Moraes decidiu suspender a nomeação do hoje deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) para a diretoria-geral da Polícia Federal. O magistrado considerou que, ao nomear um aliado seu e de seus filhos, o então presidente Bolsonaro feria a impessoalidade necessária a um cargo de comando na PF.

A decisão reacendeu acusações, já encampadas pelo bolsonarismo na época, de que a corte interferia nos outros Poderes. Essa avaliação, no entanto, foi compartilhada por colegas de Moraes. Gilmar Mendes e Dias Toffoli (então presidente do Supremo) fizeram gestos a Bolsonaro para demonstrar que a suspensão não representava o colegiado.

Os confrontos entre o Supremo e aquele governo não cessaram até o fim de seu mandato, Ramagem dirigiu a Abin (Agência Brasileira de Inteligência) e, anos depois, foi apontado em investigação dos próprios policiais federais como responsável por monitorar Moraes como parte da suposta tentativa de golpe de Estado, pela qual também é réu.

O termômetro variável da Lava Jato

A força-tarefa da Polícia Federal que começou com a descoberta do “Petrolão”, esquema de lavagem de dinheiro na Petrobras, e levou de deputados a Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à prisão, teve a atuação avalizada pela Suprema Corte nos anos iniciais.

“Tudo que a Lava Jato fez foi inicialmente referendado pelo STF, sob a relatoria do ministro Teori Zavascki [morto em 2017], com raros reparos”, afirmou Luiz Fernando Pereira, presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) do Paraná. “Pouco tempo depois, este mesmo Supremo afirmou que tudo foi feito de forma equivocada e anulou a maioria das decisões“, concluiu.

A mudança de rota incluiu a anulação das sentenças contra Lula pelo ministro Edson Fachin, decisão que o tirou da prisão em novembro de 2019 e abriu caminho para sua terceira eleição presidencial, em 2022.

Na mesma linha que embasou a reversão da situação do petista, a corte invalidou ritos da operação, apontou excessos na conduta dos investigadores e suspeição do juiz Sergio Moro (hoje senador pelo União Brasil, do Paraná) para anular condenações e acordos de leniência firmados por empresas envolvidas no esquema.

O julgamento dos casos da Lava Jato ficava a cargo da 2ª Turma do Supremo, que demonstrava divisão. De um lado, Cármen Lúcia e Fachin preservaram uma posição favorável à operação, considerada mais “punitivista”, até as fases derradeiras do processo; do outro lado, Gilmar e Ricardo Lewandowski eram críticos. No geral, o voto de minerva era de Celso de Mello.

Bate-boca no Mensalão

Antes da Lava Jato, casos de corrupção já expuseram fortes rupturas no colegiado. Em agosto de 2013, os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski chegaram a discutir publicamente no plenário da corte em um julgamento dos embargos declaratórios do processo do “Mensalão“, escândalo de compra de votos no Congresso que ocorreu durante o primeiro mandato de Lula.

Barbosa acusou o colega de fazer “chicana”, uma manobra para contribuir com recursos dos réus; Lewandowski se defendeu afirmando querer fazer “justiça”.

Enquanto o primeiro era reconhecido pela postura mais punitiva nas condenações a políticos, o segundo votou pela absolvição dos petistas José Dirceu e José Genoíno e, nos embargos infringentes, foi contrário às condenações dos envolvidos no esquema por formação de quadrilha. Anos depois, Lewandowski se aposentou do Supremo e assumiu o Ministério da Justiça de Lula.

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