O desastre do Concorde: como um simples metal levou ao incêndio, queda e fim do avião mais rápido da história
25 anos depois do acidente, o setor de aviação considera o episódio como um divisor de águas na segurança operacional

Um dos acidentes mais emblemáticos da aviação mundial revelou fragilidades em um dos maiores ícones da engenharia, provocando mudanças definitivas em protocolos de segurança e impactando a história do transporte aéreo de passageiros
O acidente do Concorde em 25 de julho de 2000 marcou o fim de uma era na aviação civil mundial, trazendo mudanças profundas nos protocolos de segurança aeroportuária e encerrando a trajetória dos voos comerciais supersônicos.
Naquele verão europeu, o voo Air France 4590 estava prestes a cruzar o Atlântico em direção a Nova York, quando uma sucessão de eventos em poucos minutos provocou uma tragédia sem precedentes na história do lendário avião.
O Concorde, operado pela Air France, decolou do Aeroporto Charles de Gaulle, em Paris, às 16h44, com 100 passageiros e 9 tripulantes a bordo.
A bordo estavam turistas em viagem transatlântica, que planejavam seguir para o Caribe em um cruzeiro após a chegada aos Estados Unidos.
A aeronave, modelo F-BTSC, havia sido designada de última hora para o voo, após a empresa detectar um defeito em outro Concorde da frota.
As trocas de peças e a transferência de bagagens contribuíram para um cenário em que a aeronave partiu acima do peso máximo recomendado para decolagem, totalizando cerca de 800 quilos além do limite previsto no manual técnico.
Características do Concorde e preparativos para o voo
O Concorde utilizava quatro motores Rolls-Royce/Snecma Olympus 593, conhecidos tanto pelo alto consumo de combustível quanto pelo ruído característico.
O procedimento de decolagem exigia o enchimento completo dos tanques, já que boa parte do combustível era consumida ainda em solo, durante o taxiamento até a cabeceira da pista 26R. Poucos minutos antes, um DC-10 da Continental Airlines havia utilizado a mesma pista.
Uma barra metálica de 43 centímetros, feita de liga de alumínio e titânio, desprendeu-se do capô do reversor do motor do DC-10 e ficou na pista, passando despercebida pelas inspeções da época, que eram realizadas com menor frequência devido ao intenso tráfego no aeroporto francês.

O momento do acidente: da pista ao impacto
Durante a corrida para a decolagem, o Concorde atingiu a barra metálica, que provocou o estouro de um dos pneus do trem de pouso principal esquerdo.
Fragmentos de borracha foram arremessados em direção ao tanque de combustível número 5, localizado sob a asa esquerda.
O impacto resultou em uma onda de pressão interna que rompeu o tanque, causando um grande vazamento de combustível – estimado em cerca de 60 quilos por segundo.
O combustível vazou e rapidamente entrou em combustão, gerando um incêndio que se espalhou pela asa e pela estrutura próxima aos motores 1 e 2.
Os registros da caixa-preta apontam que, em poucos segundos, o fogo provocou a perda de potência dos motores e desencadeou diversos alarmes na cabine.
A tripulação, composta pelo comandante Christian Marty, o copiloto Jean Marcot e o engenheiro de voo Gilles Jardinaud, realizou todos os procedimentos previstos para emergências, tentando recolher o trem de pouso e retornar ao aeroporto.
Entretanto, o mecanismo de recolhimento travou e a aeronave continuou perdendo velocidade, sem conseguir ganhar altitude suficiente para estabilizar o voo. Em apenas 121 segundos, desde o início da aceleração até o impacto, o Concorde percorreu seu último trajeto.
O avião caiu sobre um hotel em Gonesse, a cerca de 10 quilômetros do aeroporto Charles de Gaulle, matando todos a bordo e mais quatro pessoas em solo. Testemunhas e câmeras de vídeo registraram o avião em chamas ainda no ar, minutos antes do choque final.

Investigação e histórico de incidentes com o Concorde
As investigações conduzidas pelo Bureau d’Enquêtes et d’Analyses pour la sécurité de l’aviation civile (BEA), autoridade francesa de investigação de acidentes aéreos, identificaram rapidamente a origem do acidente: o contato do pneu do Concorde com a peça de metal deixada pelo DC-10.
Embora esse tipo de evento seja considerado raro, relatórios técnicos apontaram que o Concorde já acumulava um histórico de 75 incidentes envolvendo pneus e danos nos tanques de combustível, sendo o caso mais grave registrado anteriormente em Washington, em 1979, sem vítimas fatais.
No acidente do voo Air France 4590, a explosão do tanque número 5 não foi causada por perfuração direta, mas sim pelo efeito de pressão resultante do impacto dos destroços do pneu. As chamas se propagaram rapidamente, alimentadas pelo grande volume de querosene presente na asa esquerda.
O calor e a deformação estrutural comprometeram o funcionamento dos controles da aeronave e levaram à queda minutos depois.

O fim dos voos supersônicos e o legado do Concorde
Mesmo com o retorno experimental das operações em 2001, o Concorde nunca mais recuperou o prestígio e a viabilidade econômica.
A queda na demanda por viagens aéreas após os atentados de 11 de setembro de 2001, aliada ao alto custo de operação e à decisão da Airbus de encerrar a produção de peças de reposição, decretou o fim dos voos comerciais supersônicos em 2003.
25 anos depois do acidente, o setor de aviação considera o episódio como um divisor de águas na segurança operacional.
O legado do Concorde permanece como símbolo de inovação e ousadia, mas também como lembrança dos riscos envolvidos e da importância da manutenção rigorosa e dos procedimentos preventivos.
A peça de metal que provocou o acidente reforçou a necessidade de vigilância constante em todos os aspectos da aviação comercial.