As peripécias de Janja e o dilema de Lula
Ou Janja não faz parte do governo e para de agir como se fizesse, ou assume um cargo formal, com todos os deveres e responsabilidades que isso exige
Por Madeleine Lacsko / O Antagonista
O Brasil não tem bomba atômica, mas Lula tem Janja. No começo, a tentativa da primeira-dama de assumir protagonismo parecia apenas algo cômico, um detalhe irrelevante. Mas, aos poucos, o que antes era motivo de piada se transformou em um problema real para a imagem do governo. A grande questão agora é: o que Lula vai fazer com isso?
Janja quer estar no centro da política, mas sem assumir responsabilidades. Não há nenhum cargo oficial, nenhuma função institucional que justifique suas ações, e ainda assim ela age como se fosse uma autoridade dentro do governo. O problema é que isso cria um monstrengo: uma estrutura paralela de influência, sem transparência, sem deveres, mas com muitos privilégios.
Nos últimos meses, a primeira-dama já representou Lula em eventos internacionais, o que é função do vice-presidente. Em Paris, esteve à frente de compromissos sem qualquer respaldo oficial. Agora, se prepara para ir a Roma. E a pergunta é: com base em quê? Afinal, ela não é vice-presidente, nem ministra, nem ocupa qualquer cargo no governo.
E essa atuação já gerou problemas diplomáticos. A China, por exemplo, rejeitou a presença de Janja em reuniões de alto nível. É claro que os defensores da primeira-dama vão gritar “machismo”, mas a questão é simples: qual é o cargo dela? Nenhum.
No início do governo, chegou a se discutir a possibilidade de oficializar sua função com a criação de uma secretaria específica para ela. Mas o próprio Lula não quis. E por quê? Porque um cargo oficial traria responsabilidades, obrigações e, principalmente, fiscalização. E parece que Janja só quer o bônus, sem o ônus.
Enquanto segue sem cargo, mas acumulando poder, Janja continua colecionando gafes. O episódio em que, num evento oficial, ela se agachou até o chão para brincar com Felipe Neto e soltou um “F***-se Elon Musk” é apenas um exemplo do despreparo. Isso explica por que Lula prefere manter sua posição no limbo: oficializar Janja traria ainda mais dores de cabeça.
Mas a nova geração da política não engoliu esse arranjo. O jovem vereador Guilherme Kilter, de Curitiba, ligado ao grupo de Deltan Dallagnol, decidiu levar o caso à Justiça. Ele questiona a existência de um gabinete extraoficial dentro do Palácio do Planalto, que opera sem transparência e utiliza recursos públicos sem qualquer controle. E, para piorar, o governo impôs sigilo sobre as reuniões da primeira-dama.
Agora, a briga está nos tribunais. Mas ninguém quer julgar. Quem se atreve a mexer com Janja? O país já acostumou com o autoritarismo de Lula, com sua confusão entre público e privado, e até a oposição tradicional parece ter aceitado que ele governa como se fosse dono do Brasil. Mas há um limite.
Ou Janja não faz parte do governo e para de agir como se fizesse, ou assume um cargo formal, com todos os deveres e responsabilidades que isso exige. O que não dá mais para aceitar é um governo que usa dinheiro público para bancar uma influência não oficial, sem transparência, sem prestação de contas e sem nenhum tipo de controle.