Guerra à vista? O que a Venezuela pode fazer após referendo sobre anexação de território da Guiana
Governo do ditador Nicolás Maduro reivindica uma região rica em petróleo e minerais que equivale a 75% do país vizinho

A vitória do “sim” no referendo da Venezuela sobre a criação de um novo estado em um território hoje sob domínio da vizinha Guiana já era esperada. Mas o que acontece agora? A consulta popular não tem efeito vinculante, ou seja, não cria uma obrigação legal de que a Venezuela institua o estado, que é chamado lá de Guiana Essequiba.
Também não se trata de um referendo de autodeterminação, uma vez que os 125 mil habitantes do território de Essequibo não votaram – são cidadãos da Guiana, embora o projeto do ditador Nicolás Maduro inclua a concessão de cidadania venezuelana a eles.
Apesar de não haver consequências jurídicas, autoridades do governo avaliam a vitória do “sim” como um reforço da reivindicação territorial, que é alvo de disputa na CIJ (Corte Internacional de Justiça), órgão jurisdicional da ONU (Organização das Nações Unidas).
O chefe do comando de campanha para o referendo sobre Essequibo, o chavista Jorge Rodríguez, afirmou que a consulta realizada no domingo permitirá definir estratégias para o resgate do território de quase 160 mil km² em disputa com a Guiana.
“O fundamental é saber qual é o mapa que o povo da Venezuela nos traça para as estratégias a seguir no futuro”, disse o também presidente da Assembleia Nacional.
Josmar Fernández, especialista em resolução de conflitos, ressalta também que a disputa “truncou […] uma saída aberta para o Atlântico” para a Venezuela.
O lema “O Essequibo é nosso” aparece sempre na televisão e enche os muros nas ruas. Muitos analistas estabelecem paralelos com a Argentina e as Malvinas (Falklands), ilhas sob domínio britânico, mas reivindicadas pelos argentinos.
A Guiana, no entanto, insiste em que não cederá “uma palha de grama” à Venezuela, inspirada em uma música da banda The Tradewinds, que fala em “não recuar, não ceder nem uma montanha” quando “forasteiros falam em invadir”.
O tom está subindo. A Venezuela constrói uma pista militar perto da fronteira, e a Guiana propõe estabelecer bases de aliados estrangeiros na área.
Pode acabar em conflito? “É um cenário”, diz Fernández: “Quando se fala em território, estamos falando também de um compromisso onde estão impregnados sentimentos nacionalistas”, embora “a Venezuela tenha se caracterizado tradicionalmente pela negociação”.
Maduro fala em “diplomacia de paz“. O presidente da Guiana, Irfaan Ali, pede “bom senso”.
O presidente venezuelano salientou que o “primeiro efeito que a voz poderosa da unidade nacional deve ter” é fazer o presidente Irfaan Ali, que “tomou o caminho do confronto”, retomar o Acordo de Genebra para resolver a controvérsia com um mecanismo de “negociação pacífica e diplomática”.
“É uma das maiores aspirações”, destacou Maduro, que afirmou ser a “primeira vez” em “150 anos de luta” por Essequibo que “se abrem as portas dos centros eleitorais” para “exercer a soberania absoluta”.