Especialistas afirmam que Brasil precisa começar a planejar ganho com Margem Equatorial
Ajuste fiscal e medidas para mitigar crise climática são prioridades, defendem especialistas

Os cenários mais factíveis de transição energética mostram que em 2050 haverá demanda global ainda alta para petróleo e o gap em relação à oferta será de 40 milhões a 50 milhões de barris ao dia. Com reservas recuperáveis estimadas em 10 bilhões de barris, no valor bruto de R$ 3,8 trilhões, a Margem Equatorial é candidata para ajudar a suprir essa demanda por um custo de exploração que pode ser relativamente baixo.
A exploração da região requer considerar questões ambientais e também o debate sobre a destinação dos recursos públicos que poderão ser gerados, evitando que a “maldição do recursos naturais” atinja o que promete ser uma nova fronteira de exploração. Além de serem direcionados ao ajuste fiscal, os recursos também devem ser aplicados para combater os efeitos de mudanças climáticas e para mitigar as emissões brutas de gases de efeito estufa associadas à queima de petróleo e gás.
Essas são algumas das conclusões de levantamento feito pelos economistas Bráulio Borges e Francisco Pessoa Faria, ambos pesquisadores do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).

O potencial calculado para a Margem Equatorial, diz Borges, é equivalente a um novo pré-sal. “Extrapolando e usando a mesma curva, o pré-sal produzia zero em 2010 e hoje produz 3 milhões de barris ao dia. Em tese, a margem poderia chegar a isso”. O petróleo vindo da região, aponta, mais do que compensaria o declínio esperado para a atual produção brasileira de petróleo, que deve crescer e chegar a 5,5 milhões de barris ao dia no início da próxima década e depois passará a cair, chegando a menos de 1 milhão perto de 2050. “O petróleo da Margem Equatorial pode ter efeito bem relevante porque pode alterar essa curva e estabilizar a produção brasileira, pelo menos nas décadas de 30 e 40”.
Faria lembra que por enquanto não há garantias de que há petróleo na margem. Há apenas análises preliminares. Em outubro, a Petrobras recebeu licença do Ibama para a perfuração de poço exploratório em águas profundas do Amapá, na foz do Amazonas, uma das cinco bacias que compõem a Margem Equatorial.
A exploração da área suscita questões importantes relacionadas à agenda climática e ambiental, diz Borges, mas é preciso considerar os cenários mais prováveis para a demanda global de petróleo nas próximas décadas.
Ele lembra que a meta estabelecida em 2015, no Acordo de Paris, é de limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais para minimizar perdas com mudanças climáticas. Para isso, explica, teríamos que buscar o chamado “net zero”, que é zerar as emissões líquidas de gás de efeito estufa até perto de 2050 ou 2060.
Em relatório divulgado em novembro, a IEA (Agência Internacional de Energia, na sigla em inglês) projeta que, com o “net zero”, a alta média da temperatura atinge perto de 1,65ºC em 2025 e cai para baixo de 1,5°C em 2100. O relatório mostra outras duas perspectivas. No CPS [Cenário de Políticas Atuais], que considera as políticas de redução de emissão, considerando que elas serão cumpridas – a perspectiva é um pouco melhor, com alta que atinge 2,5ºC em 2100.
“Caso seja comprovado o petróleo, não explorar seria ato de heroísmo sem sentido”, diz Francisco Faria.
A demanda por petróleo e gás natural depende dessa evolução, observa Borges. Análises da IEA e da petroleira BP mostram que a demanda em 2050 no cenário net zero seria entre 25 milhões a 35 milhões de barris ao dia, o que seria atendido pela oferta projetada para o período. Mas nos cenários do CPS ou do STEPS, mais factíveis, diz, a demanda deverá ser maior e não será atendida pela oferta atual, que está em declínio, mesmo considerando investimentos e projetos já aprovados. O descompasso entre oferta e demanda deve ficar entre 40 milhões a 50 milhões de barris/dia em 2050, aponta.

O economista lembra que as estimativas atuais são de que o mundo tenha reservas de petróleo equivalentes a cerca de 1 trilhão de barris. Mas nem todas são viáveis economicamente, porque depende do breakeven, ponto de equilíbrio em que as receitas de um negócio cobrem as despesas.
Borges defende que a exploração da margem torna necessário iniciar desde já o debate sobre uso dos recursos pelo setor público. Borges defende que esses recursos sejam destinados, ao menos nos próximos dez anos, para gerar resultado primário e reduzir o endividamento da União. Ele defende também a mudança do arcabouço institucional sobre o uso de recursos oriundos da exploração de petróleo e gás natural alcançando não só União, como Estados e municípios.
“Estudos acadêmicos mostram que muitas vezes esses recursos de royalties, que são finitos, são usados para financiar despesa permanente, como de pessoal. É preciso, diz, evitar a maldição dos recursos naturais, pela qual a descoberta de jazidas de petróleo e outros minérios levem a uma deterioração fiscal porque “já se começa a gastar por conta”.



