Um julgamento que marca a história
Bolsonaro é o primeiro ex-presidente condenado por tentativa golpe na história do Brasil

A condenação de Jair Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal não é apenas o desfecho de um processo jurídico. É um marco histórico, um divisor de águas que coloca em debate o futuro da democracia brasileira, a independência das instituições e o próprio equilíbrio entre justiça e política no país.
O ex-presidente foi sentenciado por crimes gravíssimos: organização criminosa armada, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado e deterioração de patrimônio público. Um rol que, em tese, justificaria qualquer pena dura. Mas a questão que se impõe não é apenas se Bolsonaro errou ou não. É se o julgamento que assistimos foi, de fato, pautado pelo devido processo legal ou se se tornou um espetáculo de poder, no qual a Justiça trocou a toga pela militância.
A pena de quase três décadas em regime fechado soa, no mínimo, desproporcional diante de outros casos emblemáticos julgados pelo próprio STF. A impressão que fica é a de que Bolsonaro foi transformado em um troféu — um exemplo a ser exibido para intimidar opositores e fixar um recado político.
Não se trata de inocentar ou santificar quem errou. Se houve crimes, que se cumpra a lei. Mas é legítimo perguntar: será que a mesma mão pesada teria sido usada se o réu fosse outro? Ou estamos diante de um processo que, travestido de justiça, guarda os vícios da perseguição política?
O Supremo Tribunal Federal deveria ser o guardião da Constituição. Contudo, cada vez mais parece agir como ator central no tabuleiro político, interferindo no jogo com decisões que vão muito além da letra fria da lei. Quando o Judiciário se coloca acima das demais instituições, corre-se o risco de desequilibrar a democracia que diz proteger.
A figura de Alexandre de Moraes, relator e principal articulador da condenação, torna-se símbolo dessa contradição: ao mesmo tempo em que busca impor ordem, alimenta a narrativa de que a Justiça se transformou em parte interessada. E quando o juiz é visto como parte, a confiança no sistema desmorona.
A democracia não se sustenta apenas em eleições periódicas. Ela depende de instituições sólidas, imparciais e respeitadas. A condenação de Bolsonaro, da forma como foi conduzida, abre espaço para uma perigosa interpretação: a de que opositores podem ser destruídos não pelas urnas, mas pela caneta de juízes.
Eis o paradoxo: ao tentar punir um suposto golpe, o STF pode estar legitimando outro — silencioso, institucional, e tão ou mais corrosivo para a República.
O Brasil precisava de justiça. O que recebeu, no entanto, foi um espetáculo punitivo, com cheiro de vingança e gosto amargo de política. Bolsonaro não é vítima, mas tampouco deveria ser transformado em troféu. Quando a Justiça perde a medida, todos nós perdemos com ela.