Do etanol ao Pix: veja 6 pontos da resposta do Brasil à investigação comercial dos EUA
Em documento enviado a Washington, governo nega práticas desleais e rebate críticas sobre tarifas, corrupção e desmatamento

O governo brasileiro enviou resposta formal à Representação Comercial dos Estados Unidos (USTR, na sigla em inglês), rejeitando as alegações presentes na investigação aberta contra o país. O inquérito norte-americano apura supostas práticas comerciais desleais do Brasil em relação a empresas dos EUA.
A ação tem como foco áreas como sistema de pagamentos, tarifas preferenciais, etanol, combate à corrupção, propriedade intelectual e desmatamento ilegal.
Segundo a USTR, o objetivo é verificar se atos, políticas e práticas do governo brasileiro são injustificáveis ou discriminatórios, impondo restrições ao comércio norte-americano.
No documento, com mais de 90 páginas, o governo negou irregularidades e argumentou que as críticas decorrem de interpretação unilateral, fora das regras da OMC (Organização Mundial do Comércio).
A posição brasileira sustenta que as medidas contestadas não prejudicam empresas dos Estados Unidos e, em diversos casos, fortalecem a integração econômica bilateral.
Principais pontos
– Etanol
O Brasil afirmou não aplicar barreiras injustas contra o etanol norte-americano e denunciou disparidade tarifária: enquanto o produto dos EUA enfrenta tarifa de 18% para entrar no mercado brasileiro, o etanol nacional paga 52,5% ao ser exportado para os Estados Unidos.
O governo destacou que Washington mantém subsídios volumosos, incluindo créditos tributários que reduzem custos de produtores de milho, distorcendo a concorrência.
“Os Estados Unidos são o único país estrangeiro para o qual a ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) elabora relatórios específicos, visando facilitar a participação de produtores de etanol norte-americanos no programa Renovabio”, informou o documento.

– Pix
O relatório defende o sistema de pagamentos instantâneos criado pelo Banco Central, contestando alegações de favorecimento a empresas brasileiras. Segundo o governo, o Pix é infraestrutura pública aberta a todas as instituições, inclusive estrangeiras, e já é utilizado por diferentes companhias.
“De fato, diferentes governos estão tomando a iniciativa de fornecer a infraestrutura para pagamentos eletrônicos instantâneos, incluindo a União Europeia, a Índia e os Estados Unidos. O Federal Reserve [Banco Central dos EUA], em particular, introduziu recentemente o FedNow, sistema com funcionalidades semelhantes ao Pix”, registrou o Itamaraty.
O documento ressalta que o sistema ampliou inclusão financeira, reduziu custos e aumentou a concorrência.
“As políticas do Brasil não restringem operações nem prejudicam a competitividade de empresas americanas em serviços de pagamento eletrônico. Não há tratamento diferenciado a provedores estrangeiros nem barreiras de licenciamento ou operacionais específicas a provedores dos EUA.”

Combate à corrupção
O Itamaraty rejeitou críticas sobre afrouxamento de mecanismos de fiscalização, citando avanços institucionais, como atuação da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), além de novas leis fortalecendo responsabilização de empresas e autoridades.
“O USTR alega que o sistema de acordos de leniência é ‘opaco’. Ao contrário, há reconhecimento internacional de que o sistema brasileiro é transparente, navegável e eficaz para incentivar cooperação de empresas que violaram normas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras”

Propriedade intelectual e pirataria
Na área de patentes e direitos autorais, o Brasil afirmou seguir padrões internacionais, sem discriminar empresas estrangeiras. O documento mencionou cooperação entre escritórios de propriedade intelectual dos dois países e fortalecimento da legislação para coibir violações.
O relatório citou a Rua 25 de Março como ponto histórico de comércio ilegal de mercadorias. Apesar de ações policiais, a área permanece como um dos principais centros de produtos falsificados no país, sem penalidades efetivas para desestimular o mercado ilegal.
A crítica inclui demora no exame de pedidos de patente, especialmente na farmacêutica, e persistência de conteúdo pirateado em plataformas locais.

Desmatamento ilegal
O governo rebateu acusação de conivência com desmatamento ilegal, alegando que dados de satélite e operações de fiscalização indicam queda nos índices recentes. O Brasil sustenta cumprimento de compromissos ambientais assumidos em acordos multilaterais.
“O governo brasileiro empreende esforços ativos e coordenados para reprimir o desmatamento ilegal e eliminar completamente a parcela mínima de produtos provenientes de terras desmatadas ilegalmente em suas cadeias de suprimentos”, afirma o texto.
O documento é assinado pelo ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, reforçando soberania sobre a Amazônia e abertura para cooperação internacional.

Tarifas e acordos comerciais
Os Estados Unidos acusam o Brasil de tratamento preferencial a parceiros, como Índia e México, por meio do Mercosul. A resposta lembrou que a relação bilateral é majoritariamente livre de tarifas: mais de 70% dos produtos americanos entram no Brasil sem imposto, e os EUA mantêm superávit crescente na balança de bens.
Em 2024, exportações dos EUA para o Brasil somaram US$ 49,7 bilhões, contra US$ 42,3 bilhões importados.
