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Desinformação, corrupção e violência: governo do Peru aperta o cerco contra o jornalismo

Grupos internacionais de imprensa concordam que o país se tornou um ambiente altamente hostil para a profissão

Um dos jornalistas mais prestigiados da América Latina, cujo trabalho derrubou presidentes e levou a investigações criminais sobre as irregularidades do governo, estava se recuperando de um ciclo agressivo de quimioterapia quando recebeu outra má notícia: um promotor peruano o estava acusando oficialmente de receber propina.

Gustavo Gorriti, de 76 anos, editor-chefe de um órgão de imprensa investigativo no Peru, sabe muito bem o que é enfrentar problemas: nos anos 90, foi sequestrado por membros de um esquadrão da morte secreto que uma averiguação posterior revelou ser encabeçada por Alberto Fujimori – sendo que o jornalista passara anos denunciando casos de corrupção e violações aos direitos humanos perpetrados durante o governo do ex-presidente.

Mais recentemente, ajudou a expor um esquema complexo de corrupção conhecido como Operação Lava Jato, que levou à prisão e à renúncia de autoridades em toda a América Latina. Agora, corre o risco de ser preso.

A Procuradoria-Geral do Peru o denunciou por fazer reportagens positivas em troca de informações oficiais privilegiadas. Gorriti nega as acusações, que, segundo colegas e defensores da liberdade de expressão, têm motivação política e a intenção de puni-lo por trabalhos anteriores.

De acordo com grupos de defesa da liberdade de imprensa, o caso é apenas mais um entre vários ataques à mídia independente peruana, e parte de uma onda mais ampla de iniciativas de censura aos profissionais da área em um número de países das Américas Central e do Sul que só faz crescer.

“É cada vez maior o número de políticos que usam seu discurso para estigmatizar os jornalistas e a imprensa. Organizam campanhas de desinformação, promovem investigações abusivas e investem no proselitismo para alimentar abertamente a desconfiança e estimular a polarização”, disse a Repórteres sem Fronteiras.

Segundo os analistas, a perseguição de jornalistas reflete um retrocesso democrático mais amplo. Para se manter no poder, a coalizão conservadora simplesmente driblou os procedimentos oficiais, destacando aliados para os tribunais, a justiça eleitoral e a Procuradoria-Geral. 

Além disso, seus representantes aprovaram leis que dificultam a investigação, o julgamento e a punição em casos de corrupção, e mudaram a Constituição para aumentar o poder do Legislativo – que usam com uma frequência cada vez maior para perseguir os jornalistas.

É o caso de Paola Ugaz, que escancarou anos de abuso sexual infantil e corrupção em uma organização religiosa influente e enfrenta vários processos, inclusive de lavagem de dinheiro. Outros jornalistas foram condenados por difamação pela investigação de políticos, entidades religiosas e cartolas do esporte.

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