1º de dezembro: 123 anos da assinatura do Laudo Suíço
Uma história de lutas e conquistas do povo amapaense
No dia 1º de dezembro comemora-se, em nosso estado, a assinatura do Laudo Suíço. A data é tão importante que o município de Oiapoque-AP decretou feriado municipal como forma de reavivamento da memória do fato. Mas você sabe o que foi o Laudo Suíço? Os fatos que deram origem a sua assinatura? O que ele representa para a formação de nosso espaço territorial e de nossa identidade enquanto povo amapaense? Então vamos lá. Nossos servidores Michel Ferraz (museólogo) e Marcelo Jaques (historiador) explicam.
Segundo os servidores, a partir do estabelecimento das grandes navegações, iniciadas no século XV, diversas nações europeias se lançaram ao mar em uma corrida em busca de territórios e riquezas. Esse processo teve, dentre outras consequências, inúmeros atritos entre as potências marítimas da época, motivados principalmente por disputas pelas novas possessões territoriais.
“Nesse contexto, em 1643, os franceses fundaram, na atual Guiana Francesa, a cidade de Caiena e logo iniciaram uma série de incursões ao território lusitano na pretensão de conquistar e colonizar boa parte das terras hoje pertencentes ao estado do Amapá. O constante assédio francês gerou uma crise diplomático-militar entre os dois reinos, com cada uma das partes defendendo o direito sobre o referido território, sendo o principal ponto de discordância a imprecisão dos limites fronteiriços entre as duas nações”, explica Marcelo.
Para tentar dar fim à questão, vários tratados foram firmados, chegando-se em 1713 ao Tratado de Utrecht, que definiu que os limites territoriais entre a Guiana Francesa e a colônia Portuguesa se dariam a partir do Rio Oiapoque ou Vicente Pinzón. No entanto, devido às dificuldades de identificação precisa do curso natural do referido rio, uma nova contenda se instalou, agora girando em torno da verdadeira localização do referido rio: se no extremo norte do território português (como atualmente é definido) ou mais ao sul, no hoje rio Araguari, como pretendiam os franceses.
Diante do impasse, em 1841 a área entre os dois rios voltou a ser considerada neutra e passou a ser administrada em conjunto, por representantes de cada nação, trazendo uma relativa calma à região.
Todavia, a descoberta de ouro dentro da área em litígio, em 1893, impulsionou uma corrida de brasileiros e franceses em busca do novo “eldorado”, dando início a uma série de atritos entre as populações das soberanias limítrofes, que teve por desfecho um dos capítulos mais triste e sangrento da História do Amapá e da região Amazônica: a invasão da Vila do Espírito Santo do Amapá por tropas francesas, no final do século XIX.
- Acontecimento
No dia 15 de maio de 1895, em resposta a prisão do representante francês na região do Contestado – determinada por autoridades brasileiras -, um contingente de aproximadamente 130 militares francos invadiu a vila do Sagrado Espírito Santo do Amapá, sede administrativa brasileira na região do Contestado. Ao se deparar com os invasores, a população local bravamente reagiu dando início a uma série de combates que culminou com a morte de 06 soldados franceses e pelo menos 38 brasileiros, em sua maioria constituída de mulheres, idosos e crianças que, diante das circunstâncias, não conseguiram fugir no momento do ataque.
O episódio gerou grande revolta e comoção nacional e internacional. Por todos os lados se exigiu uma solução rápida e definitiva para as contendas entre as duas nações. Diante da urgência do caso, no ano de 1900 foi instituída uma comissão de arbitragem internacional em Genebra, na Suíça, objetivando por fim à “Questão de Limites”.
E para defender os interesses do Brasil na questão foi destacado o patrono da diplomacia brasileira, José Maria Paranhos (Barão do Rio Branco), que ao se utilizar dos estudos e levantamentos a respeito da geografia da região Amazônica, realizados pelo diplomata e professor gaúcho Joaquim Caetano da Silva, conseguiu provar ser o atual rio Oiapoque, e não o Araguari, a verdadeira fronteira entre as duas nações.
Perante as evidências apresentadas, e por unanimidade dos votos dos membros do colegiado, em 01 de dezembro de 1900 foi assinado o intitulado Laudo Suíço (também conhecido como Tratado de Berna) dando a posse definitiva do “Território Contestado” ao governo brasileiro. E finalmente, em 1901, por meio do Decreto nº 939 de 21/01/1901, a área foi incorporada definitivamente ao estado do Pará com a denominação genérica de território de Aricary (posteriormente redesignado município de Montenegro), dando ao estado do Amapá o formato geográfico que hoje possui e, principalmente, pondo fim a um conflito que atravessou séculos e que marcou com lutas sangue e lágrimas a História e a memória do povo do Amapá.
Vale mencionar que, completando esse processo de consolidação da posse brasileira sobre o território outrora contestado, deu-se a criação (22 de outubro 1901) e instalação (17 de janeiro de 1902) da comarca de Aricary. Sua jurisdição abrangia o município recém-criado, como também diversos povoados distribuídos pela região, tais como as localidades de Oyapock, Cunany, Lago Redondo, Aporema, Alto Araguari e Terra Firme. (FERRAZ; OLIVEIRA, 2022, p. 155).